quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

primeiro ato (colegial euclidiano) 1969 ah, o teatro!

Escuro -......" a porta se abre e no silêncio da sala, em meio às sombras que a noite traz, a voz soa em explicação:
"cena 1 -Buraco da Fechadura (invisível, mas exacerbado na ilustração e com entonação pesada): "os fatos se sucederam e eis a questão: cada mania com seu louco. É fato. E o traço escolhe um entendimento. Devo dizer que o que vocês verão será apenas uma mera ilusão. Claro! Uma ilusão real. Um espectro. Um morto. Em pleno século vinte há tudo isso. parecerá coisa do diabo! Mas, vá lá. Ainda essa ilusão me serve, e muito! Ora, eu então não sou o 'buraco da fechadura'. Claro que sim. Mas, a questão continua: cada mania com seu louco. É inversão, agora, eu acharei as ocorrências. Engraçado, será que elas irão me decepcionar? Aguardarei, oh, sim, com prazer!!!!"
Clima -Antes mesmo da porta fechar-se, uma gargalhada sobressai-se tétrica.
cena 2-......."É dia, a sala aparece clara, limpa, com seus móveis imóveis. O grande sofá, as duas poltronas, a mesinha de centro, o toca-disco, o tapete. Flores e cartazes arrojados. A janela aberta engole os ruídos da cidade desperta.
som -......." Há uma sinfonia de buzinas e o ronco dos motores. De quando em quando um apito vem ressaltar em estridente som.
suspense -........"A maçaneta gira e a porta (em cor branca), novamente é aberta, só que agora por mãos humanas. A jovem não tem mais do que quinze anos. Para a idade é 'viva' demais, para a vida uma 'aluna rebelde'.
drama leve-........"Indolentemente, acomoda-se na poltrona esquerda, com a expressão típica de quem está fuzilando....."

Um vinho tinto, uma pizza, ao som dos canhões piratas

Abro a gaveta...
como asas adormecidas, 
folhas rascunhadas estão inertes
munida de coragem, respiro fundo,
começo a tocá-las
a ler
No HD, 553,
Space,
Piratas do Caribe:
A Maldição do Pérola Negra
então:
...'uma parte de julho
toca o meu rosto à noite
é o vento do leste
suave
Outra parte desse inverno, 
pela TV, à sombra
do esquelético PT
a bofetada, 
áspera e com o dorso da mão esquerda
me acorda ao esconjuro
mas, é noite, o balançar da folhagem,
embora calmo, sugere alguma chuva
Estamos no início do mês, tem jogo da
Copa Libertadores
São Paulo e Atlético Paranaense: é briga do umbigo para baixo
Em noites assim, parece que dá para ouvir
um canteiro inteiro de capim Napier
Era o que eu queria: esse vento leve no meu rosto
Gosto de lugares simples, como a manjedoura,
para mim, basta!
Um estábulo aconchegante, ao menos
em espírito...'

...uma breve prévia de um livro nunca lançado (inédito)

......."A memória deve se assemelhar um deserto de grãos cristalinos, onde enterro meus fantasmas fósseis sem a menor chance. Suas hastes pontiagudas e muito brancas ficam arranhando a superfície de areia fofa, latejando sob a luz da inútil visão. Às vezes, porque me perturbam, desenterro-os e vou levando, um a um de seus vastos esqueletos para outro deserto mais próximo e os exponho como numa feira livre. Cansa-me o seu peso, a estatura, enojam-me suas cicatrizes frias e afiadas. Então, as pessoas se voltam, querendo tocá-los, perguntando coisas. Chegam a rir, mas não os entendem. Em momento algum, conseguem compreendê-los.
........."Tomou o elevador e desceu no 5.o andar. As paredes sujas e azuis guardavam marcas antigas. Dirigindo-se à portaria viu que pouca coisa mudara. Naquela época o porteiro tinha bigodes morenos, falha nos dentes, coxas grossas e o sorriso pela metade na boca maliciosa. Mas era um sujeito agradável, ingênuo quase. Fora despedido um mês antes da colação de grau. Agora, ninguém estava ali para inspecionar visitantes. A mesma porta larga, sem pintura, aberta ao zum-zum dos alunos.
.........."O que há de extraordinário num tipo? O que me leva a idealizar uma pessoa, tanto e a tal ponto que, ainda que ela me pareça comum, frágil, mais a realço com as coisas do meu próprio espírito. mantenho sua figura atada aos meus pés e mãos, como se uma força constante a imantasse estranhamente...." inverno de 1982