sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Somos a Casa de onde viemos

Moramos em nós a alma que habitamos
aqui e esquecemos
 nossa Casa mesmo está no sentir,
a construímos continuamente  pedra por pedra
tijolo por tijolo, tábua por tábua
mesmo que seja um cômodo ou dez ou mil
não há espaço para nós o suficiente
assim
afora nós
e novamente a queremos construir
por onde andamos
e ainda não nos satisfaz
queremos mais
às dezenas e às centenas
mais 
e
até não podermos mais
porque a vestimos  pedra,  tijolo,  tábua
e o fazemos em carne, a que odiamos,
nos incomoda a carne,
não a compreendemos,
as vísceras grudentas, pegajosas, macilentas
que cheiram a torcemos o nariz
não resiste ao tempo
que nos resiste:
fingimos gostar, admirar,
então
roubamos as flores, as ervas, as especiarias
porque nossa casa concreta inútil as inveja
belo verniz
imitamos uma natureza feliz
a que não possuímos
nos possui
Nossa Casa não pode ser edificada aqui
porque ela está dentro
em todo canto de nós
fora daqui



quarta-feira, 28 de novembro de 2012

O vir e o ir


Estou na estrada
a estrada  me leva
Eu levo a estrada
Nos seguimos
A estrada e eu
Eu e a estrada
Olho para trás
Ela olha para frente
Olho para frente
Ela olha para trás

                                                                                                                                                Nos olhamos lado a lado
simultaneamente
Ao redor
 Também a linha do horizonte
Lá longe
então
o atrás
vai sumindo
e lá na frente
vai ressurgindo
Como esvaziar um copo cheio
Ao vento
E descobrir que  vai
De novo
Se enchendo
Com o esvaziamento



terça-feira, 27 de novembro de 2012

Ainda um ínfimo cheiro perfumado de vida por aqui

Uma certa hora da noite
 os apartamentos escuros se enchem de luzes
brincam nos arredores aromas
de banho, perfumes, lanches
Hora de passear com os bichinhos de estimação
de falar com namoradas e namorados
de combinar com amigos a balada
talvez, os  mais reclusos  preparem 
um cardápio elaborado, 
junto à TV, o som, o livro
Não há uma rotina discrepante,
dissonante
É possível ouvir a água que sai da máquina de lavar,
o elevador, 
o abrir e fechar dos portões,
mesmo assim
permanece o perfume da vizinhança no ar
Café coado, omelete, carne de panela com batatas
cerveja, 
às vezes a maria joana
entra no ambiente e este
nada estridente nem repugnante
Guardam os carros, vão à academia ou simplesmente
dão voltas no quarteirão
Nem tudo está estragado
Nem tudo está perdido
Nem todos estão bichados
e doentes
Pode até que sim
quem sabe
Muitos escolhem estar à sós, 
de bem
Serão estatísticas algum dia?
Não deixam de estudar e de trabalhar
Falta algum drama?
Tragédia
Conflito...
Sei não





quinta-feira, 22 de novembro de 2012

meu telhado é um céu de beleléu

Se o quero ver
subo no banquinho, na pia e olho o horizonte
pela janela basculante da cozinha
ou vou ao jardim, subo no banco de madeira
piso na grama, canteiro, peço licença aos galhos e flores
tudo se vê na planície invertida celestina
posso caminhar até lá fora
mais paisagem ainda me espera
abro o portão
miro a serra
o quadrante de arredores
sossegada está a aurora
que me acompanha desde menina
a tarde
a noite
madrugada
feito piscapisca
de árvore natalina



quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Mariana, Mariana

Seu nome é chama
não fique preocupada
a vida espana
a dor enganada
Mariana, Mariana
ouça a música
da manhã ensolarada
dorme, dorme
nos braços da lua
prateada
Escreva sua história
encantada


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Vela acesa


Um pedacinho de noite
Acordada
Que abraça o sono desperto
lambe a madrugada
janela aberta
à brisa oeste
Quase fria do que choveu
no poente em brasa
adormecida
A sombra tardia
Se apaga
Como ligar a chave


terça-feira, 13 de novembro de 2012

O século XX fez muita gente adoecer sem saber

E elas estão vivas, medicadas
para o século XXI
Cheias de remédios e drogas
Vazias de sintomas
repletas de ressonâncias
eletromagnetizadas on line 
Atraem ,feito ímãs, a  espessa
energia negativa:
precisam de mais remédios e  mais drogas.
Outros, não, transitam pelo lixo
incólumes,
lucrativos,
até perderem os dentes
a casa
o carro
filhos e vergonha:
melhor os que perderam só os dentes...

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Meu pai e o 02 de novembro

Hoje seria uma lembrança comemorada
mas, meu pai passa muito longe daqui
ele se foi numa data 
como essa
bem cedinho,
 mal havia amanhecido
 seu sofrimento expirou
exalado
mal sabia
 o meu começara
1973

domingo, 4 de novembro de 2012

sem infância, nossos jardins se tornaram canteiros de flores sinistros



Somos 
 fiapo de unha encravada e roída de pântanos
 cutícula esgarçada do mindinho montanhoso
fio ensebado de cabelo desprendido aleatoriamente pela planície
parcial digitall nas areias incandescentes
 nano gotícula do espirro viral no carrossel de nuvens
 lágrima sangrenta do riso estilhaçado das estações temporais
 caquinha que se desprende do nariz cósmico
 bituca do sol
 birita da lua
 chulé vulcânico
cecê oceânico
 óleo azedo dos eixos polares
 graxa escura das engrenagens tectônicas
caldeira marítima das entranhas em decomposição
maus humores em magma
azia vulcânica da Terra
tornado de células descartadas
 teia do sovaco florestal
onda da tsunami de desgostos

por que nos choram?
Choramos?
cada um
um a um
voltamos ao ponto de partida
sem saída
uns passaram de ano
outros, nem apelando
mas, todos com o boletim escolar humano devidamente assinado
colado em cuspe na própria testa
Reprovados!