terça-feira, 4 de maio de 2010

Eu, Riviti, Bob Dylan e Moçambique

Seriamos nós
mais ou menos em 1975
ouvindo Desire
até 1976
em diante
tantas outras faixas
enquanto lustrávamos com o traseiro
magro
as carteiras do curso de Jornalismo Cásper Líbero
à noite, à la Paulista,
avenida estonteante
denominada corredor financeiro
pelos próprios que ali iam e vinham vertiginosamente
em gravatas apertadas,
ternos apertados,
vidas apertadas
embora nos dessem a fantasia de riqueza e propulsão.
Explodia em meus ouvidos a versão Mozambique
original
do nada virginal Bob Dylan
Aulas, aulas, aulas,
café, cerveja, stanheguer,
cigarro, sanduba ao molho
tártaro
Não viramos bárbaros.
Transmutamo-nos em seres voláteis
de intrínseca concepção
flutuante entre a realidade e a realidade
vertiginosamente aberta
e de dimensões incompletas.
Nada a completar, se me permitem,
só a acrescentar,
como Mozambique.

A ti, o mal de ti.

...
Corto tuas lágrimas secas em asas



fatio teu arrepio covarde em pétalas




lavo tuas pegadas em brasas



vaporizo tuas digitais ao incenso



levo ao cozimento teus fracassos



banho maria para teus acertos



pimenta vermelha nas tuas veias



sal grosso na tua intolerância



alho para teus erros arrogantes



espremo limão cravo nas tuas palavras de boca
cheia de babalus



alecrim salpicado no teu egoismo
tão solidário a outros egoistas
como confraria de gulosos comedores de papel moeda
argamassa, blocos de concreto e asfalto
Tu, que engoles florestas, cerrados e mangues
bebes ainda o sangue e mastigas a carne
do que te devoras
lembra-te do rio que tens ainda para secar
consumindo teu próprio espelho
Para este teu mal, só um outro mal a te absolver e curar:
tua própria ressurreição.