Um sofá de dois lugares já é muito
uma cama de casal sobra para todo canto
seis taças de vinho se basta uma
conjunto de panelas para uma iguaria
para que?
o lençol
o edredon
o ventilador de teto
uma música apenas repetidas vezes
chuveiro no verão
chocolate para um
arroz integral
é natural
um peixe de soja
uma lasanha de beringela e abobrinha
um parmesão de soja
um strogonoff de soja
um pão de grãos
um café orgânico
um vinho orgânico
uma água de fonte
uma existência orgânica
um cigarro de soja
uma vodca de soja
um tênis orgânico
vasos de soja com flores de maio e orquídea
(orgânicas...)
que florescem especificamente
(leia-se quando querem)
ou não
lá vem o jornal na porta de alguém
notícias pelo rabo de olho
a porta de entrada permanece fechada
segue seu destino incerto o lixo separado
bafora de hálito tedioso o dia
a dose de enfado na noite
faz rugas nos lábios
desodorante, shampoo,perfume
(de mato e capim... de soja, quem sabe)
a sala, o corredor, quartos, varanda
metros quadrados sobre o solo
o carro dorme na rua
não cabe na vida e a vida não cabe
no memorial quotidiano
na garagem
sem memória
ouça os pelos crescerem
a coceira no ouvido
tosse a garganta
pigarro de estórias
que cospe na pia
no ralo
dorme na cama box
TV em HD
a conta também
cadê o bem?
O ombro amigo e solitário
percorre poucas paredes
estradas
O túnel se afunila
Se toca, o telefone é mudo
e cego
Você está surdo
aqui dentro
Lá fora a sua vida
vai embora
sem sair de casa
matar ou morrer ainda não é o faz de conta
nem as balas, nem a faca, nem a miséria são orgânicas
nem de soja